um mimo
nos contos em Barão
na noite fria, mas aconchegada no café Bzaranhas
depois do jantar de ervilhas quadradas - bem haja Bonina e mais a sua gente simpática, e mais o lume, que nem sei se era dele tanta serenidade
nessa noite de quinta, dia doze, disse-se: cada um seu conto
estão aqui por arte do Zé Francisco - são todos os que foram entregues e estão a concurso, candidatos a esta peça de arte
o que deixo aqui é um conto de quem não ousou e no entanto o que escreveu merece
e eu que o li, gosto bastante
ora leiam e digam se não é um mimo
Era às sextas-feiras. A que
horas não sei, que eu ainda não sabia a leitura dos ponteiros do relógio. Na
verdade, nem lia os dias da semana, excepto o Domingo que era o dia do banho e
da missa e da catequese.
Era às sextas-feiras, dizia-me ela... lá pela
tarde, penso, que do sol e da lua sabia eu. E sabia da manhã com sopas de café
com leite, e da tarde, que ficava exactamente depois do almoço. Era por aí que
ele vinha. Sextas-feiras à tarde, decididamente.
Puxava o cordel da porta do
quintal e eu entrevia aquele olho sujo e medonho.
Sentava-se e pousava o saco.
Corria desalmada pelo
quintal, contornava o poço e gritava até chegar à cozinha:
– Mãe! Mãe! Ele está ali!
De seguida, escondia-me bem
no fundo, junto ao galinheiro, tentando ficar muito pequenina. –
Juro que nesses momentos, se
pudesse, me escondia debaixo da asa da galinha…
Ela passava com um prato de
sopa na mão, olhando-me soslaio sem mexer a cabeça:
– Vem perguntar por ti…
Tremia de medo. E ficava
espreitando por dentro da rede do galinheiro o “comer sopas” daquele homem,
sentado no lado de fora do meu quintal. Um olho no prato, outro no saco. De
certeza que se iria embora o quanto antes…
E ela lá vinha de novo, de
avental gordo e fechado. Atafulhava coisas naquele saco gigante.
Depois de ele ir embora e a
porta do quintal fechada, ela voltava do mesmo jeito:
– Para a semana vem
perguntar por ti outra vez….
Ufff! Eu não tinha ido no saco!
Não sei qual foi a
sexta-feira em que ele não veio. Fui esquecendo, e de certeza que cresci. Um
dia li horas num relógio, com minutos e tudo, e era sexta feira.
Fui à cozinha e disse-lhe:
– Francamente, mãe! Um homem
que leva meninos mal comportados dentro de um saco para os comer mais tarde?!
Isso são lá coisas de contar
a crianças?!
Comentários
Lembranças bem vivas de tempos e "coisas" que não voltam mais...
Bjs.
Bjs
Cristina Martins