da Arte

A arte é revelação, epifanias de autor que podem ou não ser partilháveis com o espectador. Porque a obra de arte mostra, com todo o seu radicalismo, aquilo que não está à nossa disposição e que para ser conhecido exige um outro direccionamento dos sentidos, diferente daquele que usamos no quotidiano, apontados agora ao inusitado e ao inesperado. A arte não é democrática, não procura consensos, não cede a normas e a vontades alheias, não claudica perante tribunais ou polícias, não transige para além dos valores que cada obra sua declara. Digo eu, e agora contestem.

Praia da Luz, na noite em que uns ouviam poesia debaixo de uma figueira, 
outros ouviam a Lua uivando aos homens.

Comentários

deodato santos disse…
sem contestação possível.

como definir esta imagem fotográfica? um objecto poético?

a sua produção, por ter vindo na sequência de outra manifestação de arte, pode levar a concluir: acontece arte autêntica quando impulsos artísticos geram outros impulsos artísticos.
francisco disse…
Será que não há contestação possível? Regra geral, as minhas afirmações são mais projecções de dúvidas do que de certezas.

Definir a imagem? E será necessário? Para uns pode ser uma lua mal fotografada com uma clareira de luz onde se vêem umas sombras; para outros pode não passar de um mero artifício digital (como acharão de tudo o que a tecnologia informática cria). Julgo que depois de legendada com o texto não resta muito espaço para a interpretação do espectador.Sim, pode ser um objecto poético.

A questão da autenticidade (sinceridade?) da arte é coisa complexa que não me julgo capaz de discutir, ou para a qual acho que não tenho suficiente conhecimento e reflexão acumulada. Mas, assim muito pela rama, não penso que só "acontece arte autêntica quando impulsos artísticos geram outros impulsos artísticos". Se bem percebo essa afirmação, estou mais voltado para acreditar em qualquer coisa dissonante disso, algo do tipo: a autenticidade dos impulsos artísticos é mais categórica, quanto maior o afastamento de outros impulsos artísticos. Portanto concluiria que tendo esta produção resultado da influência de outros impulsos artísticos que não apenas os que seriam atribuídos a esta, trata-se de arte menos autêntica.

Atentemos, porém, aos seguintes aspectos: Por um lado estou a reflectir de supetão, a quente, sobre aspectos que nunca me tinham preocupado, portanto sem grandes convicções naquilo que digo; por outro lado falta-me também uma ideia concreta sobre o que é a “autenticidade” da arte; e finalmente, não concedo liminarmente que esta obra seja sequência da outra manifestação de arte, até porque parte desta foi realizada antes da outra - talvez isso seja verdade se nos fixarmos principalmente no texto, mas o que apresento é uma soma de partes, texto e imagem.

Bem, tudo isto só serve para deixar em evidência as minhas dúvidas e a enorme ignorância que possuo sobre as questões da arte, mas é assim mesmo e não o escondo. Todavia, também desconfio que se tivesse certezas absolutas e respostas para todas estas questões não me dava ao trabalho de as discutir.

Abraço.
vieira calado disse…
Em poesia, o poema pode ser fruto duma "situação, ou acto, ou objecto poético" a que assistimos.
Se já está na nossa cabeça, pode ser fruto antigo, e já maduro, da mesma árvore.
Pela mesma razão a captação duma imagem poderá ser o resultado dum "objecto" que suscite uma emoção estética a quem o captou.
Só depois, vem a técnica, para a sua consecução.
deodato santos disse…
"arte autêntica". não faltando ao respeito à "autonomia da palavra" - e se foi essa a expressão que passou à frente na porta giratória entre o cérebro e a linguagem que materializa o pensamento, há que respeitá-la - agora teria posto "arte completa". completa porque sendo ela na sua origem um trabalho a solo, consegue ao chegar em frente a outrem nele encontrar vibração e depois projecção. e a projecção não é menos autêntica menos nobre ou de inferior projecção. quantos exemplos não haverá em todos os domínios do fenómeno artístico, em que a obra inspirada por outra foi trazer um algo mais que a outra não logrou conseguir. neste caso ela ainda foi mais completa porque veio de um meio de expressão e enriqueceu-se noutro. "arte completa" porque saiu do "solo" de origem e encontrou outros "solos" (também férteis) e se completou. e se assim foi provou uma coisa : o seu sopro era autêntico, era "arte autêntica". ( se eu soubesse alguma coisa sobre arte não estaria aqui a falar. digo o que a "autonomia da palavra", com a sua alegria congénita e inconsciente irreverência me faz dizer).
francisco disse…
Vieira Calado: concordo com essa perspectiva

Deodato: Bom, essa "autonomia da palavra" é coisa perigosa, estou a ver.
Substituir "arte autêntica" por "arte completa" e depois de explicada esta expressão, a coisa muda substancialmente de figura e então estou mais inclinado a concordar com o enunciado.
deodato santos disse…
ó francisco, muito perigosa! às vezes faz-nos dizer coisas não controladas, e que depois se revelam coisas que racionalmente não teríamos sido capazes de pensar, o que é maravilhoso. acontece com todos as artes, você sabe disso: a peça do escultor ou o quadro do artista raramente correspondem aquilo inicialmente pensado. e a personagem do romance que foge ao domínio do escritor?
veja como "arte autêntica" se deixou dominar e depois aparece no fim a dizer "ainda aqui estou e sempre estive". até esta coisa de mandar coisas para o blog: quer coisa mais autónoma, mais teimosa, mais cínica: ainda esta tarde mandei "artistas", pareceu-me que tinha dito que tinha sido publicado. não está. nos rascunhos também não. e desta vez nem tinha escrito primeiro a lápis. maravilha, a que limbo terá ido parar?
deodato santos disse…
francisco: ainda sobre a autonomia e o animismo das coisas: o blog mandou o meu post para o limbo e pôs um do Calado. e o que aconteceu? apanhado de surpresa acertei umas pendências com o passado que, de outro modo, não teria feito. a gente irrita-se com as coisas quando elas não correm como nós queremos, mas as cornas têm lá as suas razões. um abraço.
francisco disse…
Essa perspectiva da arte autêntica é discutível. Não concordo com o esse termo com o sentido que lhe associa, mas o blogue não é coisa adequada a uma discussão que, necessariamente, tem de ser feita em tempo real.

Sobre o post desaparecido: Guarda-se sempre o rascunho em word, senão o texto final, e nunca se escreve directamente na área de trabalho do blogue. Justamente para evitar acidentes desses, entre outras razões.

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