Deodato Santos - Artista? Figurinista? Escultor?
“ Sou desmesuradamente exigente para com a arte: desejava que ela trouxesse uma resposta. Senão para uma pessoa pelo menos para a humanidade. Por isso nunca me atrevi a chamar-me artista: certa vez chamei-me figurinista, porque faço figuras, hoje nem isso ”. Perceber, à conversa, quem é o Deodato artista, não é fácil. Não só porque é sempre difícil reduzir a palavras simples a obra, o sentir e o pulsar daqueles que operam no universo das artes como é difícil interpretar a sua mensagem em linguagem corrente. E talvez deva ser assim, porque se fosse fácil esse diálogo e esse entendimento, ficaria desmobilizada a manifestação artística por desnecessária. No fim de contas, será mais clara e precisa a obra artística do que as palavras da entrevista. Da entrevista possível, com poucas perguntas e mais desafios, deixamos o excerto da digressão do autor ao sabor da sua plena liberdade. Deodato Santos veio cá parar “via nascimento”, em 1939, como ele próprio referiu, portanto é lacobrigense de
Comentários
;D
"Môce... é só letrazzz, letrazzzz... bonecos, nada!
mas nem imaginam a poesia pela qual troquei esse bocado!!!
tardes
- Uns cabelos lisos que nem lençol na corda.
Assim dizia a mãe a quem a ouvisse.
E repetia: uns cabelos lisos os da minha filha.
Deslizava o pente, desempeçando.
Horas atrás de horas. Sentadas em poiais de porta.
Cada uma seu pente, sua filha, sua resma contada de palavras.
Se diziam de uma a cada outra, numa conversa pausada.
Silêncio. Palavra. E mais silêncio.
Falas de palavras e nadas. Falas nos espaços desouvidos.
E o cabelo alisado pelo pente talhado em osso de chifre.
O sentido falado nos não ditos.
A junção dos silêncios, dizendo.
Penteando os cabelos.
Nem sempre tão lisos, nem sempre tão brilhantes. Nem sempre tão embaraçados.
(Desgrenhados, piolhosos, garotávamos entre as pernas delas num à socapa que se eternizava tal o escorrer das sombras no chão de terra, tal o gatinhar dos dedos delas devassando.)
Olhavam por entre os fios, nem sempre sedosos, nem sempre longos. Emaranhados.
Puxavam. Perscrutavam.
Olhavam entre cada dois fios separados por dedos hábeis.
Aconchegavam o pente nos cabelos. Nos seus. Era um aguardando.
Tarde era até se dar a luz do sol.
Não se pense. Não eram tardes de afagos.
Eram tardes de trabalho e arte. Dolorosas tardes.
Tardes de silêncios largos, entrecortados de salpicos de sílabas, uma ou outra palavra.
As tardes longas de catar os bichos à luz das tardes.
Mena