A visita do Presidente da República Sidónio Pais em 1918


O povo lacobrigense aguardava o Chefe de Estado desde as 18h00, mas só às 21h00 o Sr. Dr. Sidónio Pais e a sua comitiva, na qual se incorporara também o Governador Civil Sr. Cabeçadas, com o seu secretário, chegaram àquela cidade, em automóveis, sendo estes escoltados por forças da Guarda Republicana a cavalo, formando a força do regimento 33 e executando a banda o Hino Nacional. O largo da Praça Gil Eanes estava repleto de povo e as janelas com luminárias e imensas senhoras, lamentando-se que S. Exas. não pudessem ter chegado de dia, como estava anunciado. Ao descerem dos autos foram ovacionados com uma salva de palmas, levantando-se muitos vivas à Pátria, à República e ao Presidente e mais revolucionários do 5 de Dezembro.

O Presidente da República e a sua comitiva entrou então na Câmara Municipal, onde foram brilhantemente e delirantemente recebidos. Deu as boas vindas ao Chefe de Estado o Presidente da Câmara, o artista João Trigoso, que em palavras cheias de patriotismo e honestidade expôs aos ilustres visitantes a índole do povo de Lagos, lastimando que S. Exa. não tivesse chegado mais cedo, para assim poder avaliar e sentir o belo sol algarvio e as floridas amendoeiras, e, igualmente, afirmou a sua qualidade de velho e honesto republicano que só deseja a união de toda a família republicana para felicidade da Pátria e da República.

Respondeu Sidónio Pais naquilo que o correspondente do «Século» classificou com um «brilhantíssimo e patriótico discurso», o qual, aliás, segundo o «Diário de Notícias», teve a duração de 45 minutos. O discurso do Presidente em Lagos deixou em todos os ouvintes a grata impressão dos seus vastíssimos conhecimentos e honestos propósitos patrióticos, afirmando que o movimento de Dezembro tinha realizado a Nova República que levaria a todos os portugueses a liberdade de pensamento e o bem-estar, levantando por fim depois de agradecer com palavras de louvor a generosa recepção que lhe fizeram, um viva ao povo de Lagos.

Ouviram-se muitas palmas e foram erguidos vivas à Pátria e à República Nova. Depois seguiram nos autos a visitar a sala dos oficiais do regimento 33, onde foram distintamente recebidos pela oficialidade e elemento graduado da sociedade lacobrigense. Fez a apresentação da oficialidade ao Sr. Dr. Sidónio Pais o Tenente Coronel João Veloso Leote, afirmando-lhe que podia contar, com a fidelidade da oficialidade e soldados do mencionado regimento para defesa da Pátria e da República. Respondeu o Chefe de Estado que folgava imenso com tais declarações pois sentia-se orgulhoso de se encontrar na sala dos oficiais do regimento que mais brilhantemente se tinha batido na revolução de 5 de Dezembro, tendo palavras de simpatia para esses bravos militares.

O «Diário de Notícias» acrescenta ainda que era aquele corpo cujo batalhão com ele esteve no Parque Eduardo VII aquando da Revolução.

Finda a visita, os viajantes dirigiram-se para a Escola Industrial, onde visitaram as aulas de desenho e bordados das alunas e trabalhos de palma. Na escola, encontravam-se muitas senhoras e altamente representado o elemento oficial e a mais distinta sociedade lacobrigense. Na ocasião em que S. Exas. visitavam a sala de pintura a admirarem os trabalhos feitos pelo ilustre artista João Trigoso, foi pelo mesmo oferecido ao Sr. Presidente da República um grande quadro, um dos seus melhores trabalhos.

Porque o estômago também tem de ser aconchegado, mesmo o de um Presidente da República, o correspondente de «O Século» salientava que «depois foi oferecido um lauto chá e bolos dos melhores que se fabricam na região, decorrendo tudo com grande brilhantismo e animação».

À meia-noite o Sr. Presidente da República, ministros e mais comitiva faziam as suas despedidas, sendo por fim levantados muitos vivas aos ilustres hóspedes, à Pátria e à República.


In http://www.barlavento.online.pt/index.php/noticia?id=18283~



ao ler o artigo fiquei a pensar nalguns aspectos que o tempo alterou e noutros que manteve intocáveis, cismando acerca dessa acção erosiva diferenciada que o velho das barbas protagoniza, às vezes:

o incumprimento de horários por parte dos governantes é coisa que já vem de longe (das 18h00 para as 21h00, é o normal);

as lumiárias dão o toque necessário a ajuntamentos de imensas senhoras (não comento a imensidão das senhoras);

na câmara municipal foram delirantemente recebidos (está conforme);

Era presidente da Câmara um artista (bem… artistas, artistas há muitos);

o discurso de 45 minutos (mantém-se o hábito);

um lauto chá e bolos para aconchegar o estômago (chá e bolos às 11 da noite? Então e o jantar???)


Comentários

Mena G disse…
"sendo estes escoltados por forças da Guarda Republicana a cavalo"...
É claro que tinham que chegar atrasados! E, provávelmente, foram forçados a parar no caminho para matar a fome com uma bucha.
É muito justificado o apetite para o chá !
E, se fosse hoje, ainda tomavam chá mais tarde!Teriam que pedir umas bestas emprestadas ( porque cavalos são poucos), e as bombas de gasolina secaram de todo.

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