o centro - A cidade

carece de alma a minha cidade
prostitui-se
deu o centro do seu corpo por uns trocos
nem sequer ao homem da merceeiria
nem sequer ao carteiro
nem ao homem do talho ou ao padeiro
a esses, como até mesmo ao homem do supermercado
a minha cidade escorraçou para longe
afastou do seu centro os mais fervorosos
os devotados amantes,
ela perdeu-os todos
escorraçou-os

vendeu-se por uns trocos
engalanou janelas, pintou entradas
mas morreu por dentro
já não se senta na soleira conversando
já não assoma em janela em noite de levante
a minha cidade tranca-se com medo de assaltante

não tem criança correndo acima e abaixo
não tem criança no seu coração a minha cidade
e não tem riso que não seja de garrafa
pela noite dentro, nas soleiras das portas
nos peitoris das janelas encerradas
na calçada de pedrinhas, renovada
apenas garrafas abandonadas e ruídos
cacofonias de palavras sem falas

embebeda-se por um nada esta cidade
não tem vivalma
não tem gente que ao passar a conte
que a envie a outros num sorriso: viva! boa noite!
carece de alma a minha cidade
morre de si mesma por uns míseros trocos

Comentários

Ana Pallito disse…
Verdadeiro e mui Belo!!!!

Bom domingo amigo.\0/.
Fátima Santos disse…
Ana, perdoe, mas tá lá escrito meu nome e não é nome de macho
perdoe, mas poraqui há gente variada, viu?!
volte sempre e lhe envio meu cumprimento por ter gostado
Sissi disse…
Tem toda a razão minha amiga,o centro da nossa cidade escorraçou quase todos os seus moradores.
Beijo e bom fim de semana.
Mena G disse…
Um "desertos histórico", é o que é...
Muito bem "pintadas", as noites da Agosto.
É rameira e galdéria!
Um lamento!
Um bem-querer…
Soidade do ontem?
Um hoje a fender…
éf disse…
o mal dos trocos é geral e esta miséria é global. e que se deveria esperar se o poial da porta e o parapeito da janela passaram aqui para a net, transferidos da TV depois de 30 anos de carreira?!

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