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A mostrar mensagens de agosto, 2007

O banho de vinte-e-nove

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Aljezur: Reza a lenda que os Cavaleiros de Santiago , chefiados por Dom Paio Peres Correia , surpreenderam os mouros a banhar-se no mar, longe da protecção das muralhas da vila, como era sua tradição. Tal foi o massacre que o mar ficou vermelho. O castelo foi conquistado em 1249. In Guia Expresso de Portugal , 1995 Mais precisamente a 29 de Agosto de 1249. Assim reclamava Dom Afonso III a conquista do último reduto do, até então, território do Gharb . Desde miúdo que ouço falar no “banho de vinte-nove” (de Agosto). Um banho que, no dizer das pessoas mais idosas da aldeia do concelho de Santiago do Cacém de onde sou natural, era um banho de mar que valia por todos os banhos que se pudessem tomar ao longo do ano. Aliás, realizavam-se verdadeiras caravanas de carros de bestas e toda a sorte de veículos a caminho das praias, por todo o Alentejo litoral e costa ocidental do Algarve. O meu pai até conta que vestiam a melhor roupa que tinham, o fatinho de ver-a-Deus, por cima do calção de

estórias de Lagos & arredores, o livro

Jorge Luís Borges dizia «que todo o poeta inteligente é um bom prosador»; assegurava ainda que o ponto de partida para essa ideia fora Stevenson, mas isso já era apanágio de um homem brilhante como o era Borges que deixava sempre a ideia de que, por mais inaudita fosse, uma excelente ideia nunca partia dele. Estórias de Lagos & arredores, de Vieira Calado, é, para mim e acima de tudo, o artifício de bem saber prosear. E isso percebe-se de imediato, assim que começamos a descer a rua com o autor e, com ele, nos espraiamos, « por força da quentura dos ares deste chão benzido pelos deuses da frouxidão e da pasmaceira; e da costa esbelta onde o mar vem desaguar uma salmoura apetecível em areias louras, tomadas pelo mel de meridianos sóis » (pág.11) deixando a apatia na firmeza insípida de uma calçada debaixo das solas; as cidades, os homens, a vida e a morte repetem-se nos tempos e espaços, e ficariam reduzidos à banalidade de acontecimentos, ou na memória restrita dos afectos, não fos
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É com algum embaraço que, finalmente, ouso romper a cor do meu espaço branco. Nada de verdadeiramente interessante. Um rabisco. Um rascunho. Uma tentativa de rasgar a tímidez abrir de vez uma porta que me leve a aventuras mais sérias. Gosto de desenhar e não sei. Mas é assim, dá-me gozo... Gosto de rabiscar gente. Corpos de pessoas assimétricas desajustadas das noções de estética estabelecidas por quem é realmente feio. Gosto de pessoas corporalmente expressivas. Só essas se encaixam nas desproporções dos meus rabiscos... Tenho rabiscado pés de gente. Pézinhos. ( Manias...) Saíu-me um rabisco de bailarina. Tem uma história por contar na dança que eu imaginei. Hoje rompo a cor do meu blog branco. Ainda é cedo para romper o silêncio. dança no perímetro da escarpa afiada trezentos e sessenta graus

Lagos (do post anterior)

Get Your Own Player! Vi esta postagem, do Vieira Calado, e foi logo ali ao lado gravar a canção. "com: Interpretação de José Bandarra e Arranjos de Paulo Ribeiro"

LAGOS (CANÇÃO)

........ LAGOS .... .... Ai Lagos, terra algarvia debruçada sobre o mar, da tua linda baía de belo sol a brilhar partiram as caravelas que foram para além-mar. Ó Costa d’Oiro adorada onde o azul do céu ameno onde o eterno mar sereno fazem tintas de igual cor, tu és a moira encantada das amendoeiras em flor. .... Ai Lagos, Lagos, terra ditosa .... tu não sabes como és linda, .... teu passado brilha ainda .... ó bem-formosa. .... Ai Lagos Lagos, terra de encantos, .... o teu sol brinca com o mar .... quando as ondas vão beijar .... os teus recantos. Ai Lagos à beira-mar minha terra de encantar, sinto em mim por ti crescer uma voz a me dizer que és a mais bela princesa que vive na natureza. A letra da canção é de Vieira Calado; a música é de Genny Telles. Ambas foram escritas em 1957 e a canção foi origináriamente interpretada pelo tenor José Gonçalves, tal como o autor da letra, natural de Lagos.

Às curtanheiras

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Moças rosadas do calor que a apanha dava. Figo de tamanho diverso. Figos vários, de Junho para a frente ou até antes. Maduros, primeiro os lampos e mais tarde os inchários. Figos mais encarnados que verdes, quase lilases, a derramarem vermelhos melados desunindo o bico em quatro brancas interioridades: um avesso felpudo. Figos verdes por fora e tão rubros por dentro, os que as moçoilas apanhavam em grandes quantidades, as saias presas com um alfinete entre as partes, ei-las escarranchadas num galho mais forte, o lenço rodado sob o queixo, atado atrás sobre o pescoço. A medo ou em descarado jeito, papavam um e outro que eram frescos e apaziguavam fome e sede. Comiam-nos inteiros. Casca e tudo. Enfiados na boca que figo deste tipo, maduro pelas branduras de entre Junho e Agosto, é as mais das vezes, figo miúdo. O figo coito para secar nas esteiras, para comer torrado nos frios do Inverno vindouro, para fazer os santinhos . Por vezes, corria do figo um fio de leite. Um peganhento

Claustrofobias, o livro

O culto do objecto. Sendo um livro, começa-se pelo apreço da capa, que é bonita. Passando pelo desígnio do autor, fica-se com a ideia de que há uma tentativa de justificação do acto da escrita, o que, para mim, é sempre improcedente; escrevemos aquilo que queremos ler (ou ouvir contar) e ainda ninguém escreveu (ou nos contou); escrevemos pelo prazer de realizar, é uma forma de edificação como outra qualquer; escrevemos para apertar o nó à corda que se balanceia e nos coloca à prova em cada patíbulo; escrevemos para limpar o baço do espelho; escrevemos por idealismo, o culto de ser autor; escrevemos porque a isso não somos obrigados; enfim, escrevemos! O prefácio é como um bom prefácio deve ser: generoso; exultante, anima de expectativa o leitor. O livro: é pela atmosfera que nos enredamos sem grandes resistências e nos dispomos a estar presentes; se atentos, não nos escapará a interessante ligação temporal entre as diferentes partes da narrativa, que nos parece consonante apesar das in

duas artes

Eram pouco mais de 7 horas e a Meia Praia estava farta, como se da barriga de uma onda tivesse havido um parto desmedido. O cão ladrou ameaçador, ali estava tudo aquilo que ele defendia como seu: os tractores, os cabos, as redes, as gentes e o barco; não seria da sua responsabilidade a guarda do pescado ou quem o levava em caixas tinha o seu consentimento; aceitava sem reservas ruidosas a trasfega. Dois homens afastaram-se daquele centro de azáfama com os olhos ao largo; o barco deles ainda navegava e demoraria; meti conversa e um deles fez-me saber, crítico, que apesar da proibição de viaturas no areal, aquela lava fora puxada por máquinas, um homem ou dois para ajeitar o cabo; – suspendeu por instantes o que me dizia e julguei pressentir-lhe a dúvida; fi-lo continuar dizendo-lhe que percebia; «cabo» fora a palavra que o suspendera; por um brevíssimo instante, ele avaliou quem tinha pela frente, e dispunha-se a alterar a mensagem para a incorrecção de «corda». Por instantes fiquei eu